A proa que nunca pára
Esta é a proa, de terra feita, que eternamente assiste à união de dois dos grandes rios alemães: Reno e Mosela. Há proas assim... Quedam-se a assistir à união contrariando a natureza daquilo para que nasceram.
Uma espécie de simbiose entre os termos "Bocas" e "Recados". When everything is calm and certain, I initiate some action to provoke uncertainty. I somehow know that certainty is the first sign that death is arriving.
Esta é a proa, de terra feita, que eternamente assiste à união de dois dos grandes rios alemães: Reno e Mosela. Há proas assim... Quedam-se a assistir à união contrariando a natureza daquilo para que nasceram.
Apesar de as auto-estradas alemãs serem consideravelmente melhores que as portuguesas, e não olhando ao facto de não serem pagas directamente pelos utentes, e não tendo em conta que são formadas quase sempre por três faixas de rodagem em cada sentido, e não considerando que são controladas por placas e sinais electrónicos que apresentam as regras de trânsito sempre de acordo com as condições climatéricas, há que dizer que é uma grande complicação encontrar um destino, seja ele qualquer, na imensidão alemã. Só um bom sistema de GPS nos poderá guiar!
O sistema de GPS, montado em grande parte dos carros alemães de gama média-alta, é a única orientação válida e eficaz para nos fazer alcançar uma localização no meio do tudo. É bastante complicado lidar com este sistema, é verdade, mas depois de me aperceber que Bertimmungsort era para inserir o destino e que Auserwählt significava seleccionar a opção e que Weg era a indicação da rota, as coisas até se tornam relativamente claras para um qualquer português. Claro que se tivesse entendido, com a devida antecedência, que Sprache queria dizer idioma, tudo ficava facilitado logo de começo: Auserwählt o Sprache português e depois era só inserir o Bertimmungsort que o sistema calculava-me a Weg.
A história não se resumiu à simplicidade do último parágrafo, pois, primeiro que conseguisse pôr o GPS a dizer qualquer coisinha foi o cabo dos trabalhos! Como bom português não consultei o manual de instruções, propositadamente deixado no porta-luvas, e fui carregando nos inúmeros botões do sistema até o conseguir pôr a falar. Foi difícil mas depois de apertar um pouco com o espertalhão ele lá se descaiu e começou a bocejar uns palavrões em alemão. Socorri-me pois do Auserwählt para seleccionar o primeiro idioma que me apareceu à mão. Foi o inglês. Comecei a ouvir uma voz de mulher a dizer-me turn rigth, turn left e por aí adiante. Vi naquela voz uma mulher de 50 anos, olhos azuis mas estrábicos, cara rosada mesmo sem pinga de álcool, obesa quanto baste, com alguns problemas na área das matemáticas porque as indicações de próximo cruzamento a 100 metros nunca acertavam bem nos 100 metros. Era sempre mais ou menos, mas nunca 100 metros. Mudei pois para o meu idioma, o meu português. Foi aí que decidi iniciar este processo por difamação. “Vire à di-rei-ta!”. Não é que me meteram uma velhinha a dar as instruções em português! Uma velhinha acabada com muito mais de 100 anos, sem convicção alguma, doença de parkinson, voz trémula e acompanhada de um respirar asmático! A morrer, diria, se aquela voz não estivesse ali gravada para a eternidade. Esta foi a forma mais encapsulada que alguma vez vi de difamação das mulheres portuguesas! Proponho, pois, um “abaixo assinado”, uma manifestação às portas do Parlamento Europeu. São estas pequenas coisas que deixam de rastos o turismo em Portugal. Ninguém nos virá visitar ao ouvir uma voz que desperta, apenas, dó!
O GPS em italiano, isso sim, é personalidade é convicção, quase que apetece conduzir de olhos fechados, mudar de rota, entrar... entrar... entrar Itália adentro. É uma morena de 25 anos, tenho a certeza. Nariz empinado, bem torneada, cabelos pretos que até fazem doer, olhos delicadamente rasgados e que rasgam quem os ousa encarar, lábios grandes lábios a lápis sublinhados! Uma mulher que sabe aquilo que quer e não quer outra coisa senão aquilo que sabe. Uma presença para quem os decotes são supérfluos como são supérfluas todas as extravagâncias. A sua existência, enquanto entidade separada de tudo o resto, é lhe quanto baste. Dá gosto ouvir aquela voz! Pois é meus amigos, até no GPS somos discriminados. São lixados estes alemães!
Esta foi uma visão do interior da catedral de Colónia ou um acesso aos antípodas da mente? Sem quaisquer aditivos, mescalina ou ácido lisérgico, sem hipnose, sem a indução do dióxido de carbono, sem coisa alguma, ali, naquele interior, todas as correntes redutoras do cérebro se quebraram. Uma catedral assim submersa é, sem dúvida, um acesso à inconsciência comum, não é assim caro Huxley?
No Vetter pode beber-se, entre outras, uma cerveja Vetter feita nos alambiques de cobre que no seu interior se misturam com os clientes. 33% do seu líquido é álcool! É um daqueles bares onde pedimos Peanuts e eles, por mero lapso, podem trazer-nos uma Guiness.